Deve
a mulher cristã usar véu na igreja hoje?
(Adaptado)
É
comum encontrarmos em algumas de nossas Igrejas, pessoas com dúvidas sobre o
uso do véu feminino dentro do templo, com base em declarações do apóstolo
Paulo. Como é certo que não podemos confundir princípios com costumes,
precisamos analisar até que ponto as orientações de Paulo à igreja de Corinto,
no que se refere ao uso do véu pelas mulheres, também são aplicáveis à igreja
cristã da atualidade, inclusive a Igreja Adventista do Sétimo Dia. Vamos,
primeiramente, analisar um pouco sobre a situação da igreja de Corinto na época
do apóstolo.
Com
base em informações levadas a Paulo pelos da família de Cloé (1Cor. 1:11), o
apóstolo ficou sabendo do espírito divisionista com que vários setores da
igreja se identificavam com líderes específicos (1:10-17). Outros pontos
abordados por Paulo em sua primeira epístola podem também ter sido relatados a
ele pela casa de Cloé, ou por outra fonte (talvez Estéfanas, Fortunato e Acaico
– 16:17). Foram eles:
1.
Alguns que recaíam aos antigos hábitos da vida (cap. 5)
2.
Haviam dúvidas sobre o matrimônio (cap. 7)
3.
Problemas quanto ao consumo de comidas sacrificadas a ídolos pagãos (cap. 8)
4.
Haviam aqueles que estavam participando de forma errada da Ceia do Senhor
(11:17-34)
5.
Os dons espirituais estavam trazendo confusão ao culto público, especialmente o
dom de línguas (cap. 14)
6.
Outros não criam na ressurreição e em temas relacionados a ela (cap. 15)
7.
E também haviam problemas referentes à participação pública das mulheres no
culto (11:2-16)
Vê-se
que na igreja de Corinto Paulo enfrentou problemas que não surgiram nas demais
igrejas. Ele não preocupa-se em escrever sobre a maioria destes temas às outras
igrejas, mas somente a Corinto. Isso mostra que esta igreja passava por uma
crise doutrinária e de costumes, que refletia muito bem a situação cultural e
religiosa da época e do local.
Vamos
analisar aqui, particularmente, a exortação de Paulo às mulheres cristãs de
Corinto, com relação ao uso do véu. Por que ele tratou desse tema naquela
igreja? O mesmo conselho do apóstolo (para que as mulheres usem véu sobre a
cabeça durante o culto público) tem validade universal para todas as igrejas
cristãs?
Para
responder a estas perguntas, vamos estudar primeiro um pouco sobre dois pontos
importantes:
1)
a maneira como as mulheres se trajavam na época;
2)
o significado do véu naquela circunstância.
Um
antigo costume
Na
Antiguidade, a mulher carregava no corpo um sinal da autoridade do marido. Esse
sinal era o véu. Esse mesmo costume prevalece até hoje entre alguns povos do
Oriente. Nestes lugares, a mulher honesta não deve aparecer em público sem o
véu, ou algo correspondente. No Irã, por exemplo, se usa o xador; no
Afeganistão, os Talibans criaram a burca (um vestido comprido que cobre até os
olhos); na Arábia Saudita, uma mulher pode até apanhar de chicote, caso esqueça
o véu em casa.
O
significado do véu
Era
um sinal da honra e da dignidade das mulheres (Gên. 24:65; Cant. 4:1). Também
considerava-se o véu um sinal de subordinação da mulher ao marido, por isso que
não o usavam as mulheres de luto, as prostitutas e as esposas infiéis.
No
tempo dos apóstolos, esse costume ainda era largamente praticado, mas parece
que em Corinto um movimento de libertação feminina estava se iniciando e
tirando a paz da igreja. Por isso, as mulheres estavam tirando o véu no culto
público, por sentirem que o Evangelho as libertava do “jugo” do marido. Isso
estava causando intrigas nos lares e na igreja, e estava também repercutindo
mal na comunidade, pois as pessoas que presenciavam os cultos cristãos
escandalizavam-se por ver mulheres sem véu (ou seja, "indecentes" e
"desonradas") tomando parte no culto. Seria realmente aquela uma
religião própria para mulheres honestas e fiéis, ou tratava-se de uma seita
formada por prostitutas? Era a crítica normal feita à igreja.
Então,
como vimos anteriormente, o problema chegou ao conhecimento do apóstolo Paulo,
que escreveu a carta para orientar à igreja sobre este tema, entre outros.
A
orientação de Paulo
Primeiramente,
o apóstolo preocupa-se em reafirmar o princípio bíblico da igualdade entre os
sexos (7:3-4). Mas, ele também confirma que o homem deve ser o “cabeça” da
mulher, apesar da igualdade entre ambos (11:3). Em seguida, o apóstolo orienta
que as mulheres cristãs seguissem o costume do uso do véu, próprio naquela cidade
e ocasião (v. 6). Vê-se que o véu não era para todas as igrejas, mas para
aquelas fundadas em lugares, especialmente no Oriente (como era o caso de
Corinto), onde seu uso significasse submissão feminina ao marido, como manda a
Escritura (Gên. 3:16).
Nos
vv. 4-16 Paulo trata do tema de cobrir a cabeça, especialmente em relação com
os serviços religiosos. Esta realmente é uma das passagens de Paulo à qual bem
podem ser aplicadas as palavras de Pedro, de que Paulo escreveu
"algumas" coisas "difíceis de entender" (2Pe 3:16), por
isso precisamos estudá-la livre de preconceitos ou idéias preconcebidas.
Devemos deixar que o contexto da passagem fale o que ela realmente significa.
Paulo
proclamava uma nova e gloriosa liberdade no Evangelho. Essa proclamação tinha em
si a semente do princípio cristão da dignidade do sexo feminino e sua liberação
da condição degradada em que eram tidas as mulheres nos países pagãos. O
apóstolo declarou: "Não há judeu nem grego; não há escravo nem livre; não
há varão nem mulher; porque todos vós são um em Cristo Jesus" (Gál. 3:28).
Essa deveria ser a prática na vida social da Igreja que estava dando seus
primeiros passos.
Porém,
uma revolução social tão marcante não aconteceria sem problemas. Seria fácil
ver como algumas mulheres convertidas ao cristianismo poderiam distorcer e usar
mal sua liberdade no Evangelho para causar descrédito à igreja. Uma das
difamatórias e infundadas acusações que se apresentaram contra o cristianismo,
à medida que este se difundia e que despertaram o ódio de muitos, foi que os
cristãos eram imorais. Não há dúvida de que esta acusação já podia haver-se
espalhado nos dias de Paulo. Por isso era muito necessário que os cristãos se
abstivessem "de toda espécie de mal" (1Tes. 5:22), e que recordassem
o conselho adicional de seu professor: que embora certo proceder seja lícito,
pode não ser conveniente (1Co 6:12). Mesmo que o Evangelho libertasse as
mulheres de sua condição humilhante (mas, não descartava a autoridade que o
marido deveria manter sobre a família), elas não deveriam utilizar esta
“liberdade” para agir no culto público de forma a trazer escândalo, como
acontecia com o abandono do uso do véu.
Esta
análise do contexto da 1ª epístola aos Coríntios não deve ser desconsiderada,
se queremos realmente obter a mensagem que o apóstolo tinha em mente ao falar
àquela igreja.
O
uso do véu por si só não produz honra, pois prostitutas também chegaram a
usá-lo no passado (Gên. 38:14-15). O que as mulheres cristãs mais deveriam se
preocupar era com a decência do vestuário, pois ele seria uma demonstração do
caráter da mulher que se apresentava para participar do culto (1Tim. 2:9).
Da
mesma forma, os cabelos compridos, somente, também não trazem honra, pois a
mulher que enxugou os pés do Senhor Jesus, o fez com os próprios cabelos, que
eram muito grandes, entretanto sabemos que sua honra não era das melhores (Jo
11:2; Lc 7:37-39). Quanto aos homens, nos dias de Paulo o costume entre os
judeus, gregos e romanos era levar o cabelo curto. Entre os israelitas se
considerava como vergonhoso que um homem tivesse o cabelo comprido, a menos que
tivesse feito o voto de “nazireado” (Núm. 6:1-5).
COSTUMES
(locais) X PRINCÍPIOS (universais)
O
tema do uso do véu, na verdade, deve levar-nos a analisar o princípio envolvido
por trás da exortação do apóstolo, pois bem sabemos que os costumes culturais
variam com o passar do tempo; os princípios envolvidos, não. Por exemplo:
1.
Deus mandou que Moisés retirasse as sandálias dos pés, pois o local em que
estava era terra santa (Êx 3:5). Algumas religiões orientais seguem o mesmo
costume ainda hoje, tirando os calçados quando vão entrar no templo para
adoração. A ordem de Deus indica que temos que tirar o calçado quando nos
aproximamos dEle em adoração? Devemos obedecer a mesma “ordem” ainda hoje? É
claro que não, pois a mesma não aparece em nenhum outro momento, sendo que nem
Jesus nem os apóstolos determinaram que essa deveria ser uma prática para a
igreja mundial. Precisamos entender o princípio envolvido: reverência,
respeito, humildade e submissão. Os costumes podem variar de cultura para
cultura, mas o princípio da reverência é universal.
2.
Para a problemática igreja de Corinto, Paulo também adverte que as mulheres
deveriam ficar “caladas” na igreja (1Co 14:34). Seria este um conselho a ser
seguido para todas as igrejas? Não. Se assim o fosse, ele o teria enviado às
demais, mas enviou apenas para a de Corinto, o que mostra o caráter local dessa
determinação. O princípio é o mesmo do uso do véu e da manifestação ordenada do
dom de línguas – manter um culto reverente e livre de aparência do mal,
evitando que se traga opróbrio à Igreja de Deus.
3.
Os homens também deveriam cobrir a cabeça quando fossem ler as Escrituras (2Cor
3:14-16). Devemos seguir o mesmo costume hoje? O próprio Paulo diz que não,
pois os judeus que faziam isso em sua época o faziam por não conhecerem a
liberdade trazida pelo evangelho, como o próprio apóstolo declara (v. 16). O
princípio envolvido aqui, mais uma vez, é a reverência para com o Senhor.
4.
E o que dizer do ÓSCULO SANTO (cf. Rom. 16:16; 1Cor. 16:20; 2Cor. 13:12; 1Tess.
5:26)?
Poucos
são os "barbados" que adoram buscar pretextos nos costumes bíblicos
(a exemplo do uso do véu, mulheres caladas na igreja, etc.), e que estão
dispostos a saírem trocando beijinhos com seus "irmãos bigodudos".
RESUMO
Após
analisarmos o contexto das afirmações de Paulo sobre o uso do véu na igreja de
Corinto podemos entender, livres de concepções pré-estabelecidas, que o uso do
véu era um costume adequado àquela época, mas que não precisa ser observado na
maioria das igrejas cristãs atuais, com exceção daquelas que estejam situadas
em comunidades nas quais o véu seja um símbolo de recato, pudor e submissão da
mulher ao seu marido, o que não é o caso do Brasil.
Temos,
então, a seguinte compreensão para a passagem que trata do uso do véu em
Corinto:
1Co
11:5 – “Toda mulher, porém, que ora ou profetiza com a cabeça sem véu desonra a
sua própria cabeça, porque é como se a tivesse rapada.”
A
mulher que se apresentasse sem o véu, estava desonrando a si mesma, pois seria
considerada de má fama, como acontecia com aquelas que raspavam a cabeça.
11:6
– “Portanto, se a mulher não usa véu, nesse caso, que rape o cabelo. Mas, se
lhe é vergonhoso o tosquiar-se ou rapar-se, cumpre-lhe usar véu.”
Se
a mulher achava que tinha a mesma liberdade do homem para não usar o véu, então
que também cortasse o cabelo como os homens cortavam. Mas isso seria ainda mais
desonroso para ela. Então, o mais sensato seria usar o véu no culto público.
11:7
– “Porque, na verdade, o homem não deve cobrir a cabeça, por ser ele imagem e
glória de Deus, mas a mulher é glória do homem.”
O
véu simbolizava a submissão que a mulher deveria ter em relação ao marido. Como
o homem era feito à própria imagem de Deus (vv. 8-9), ele não deveria usar o
véu, mas a mulher sim, pois ela estava em uma posição de respeito e submissão
ao seu marido.
11:10
– “Portanto, deve a mulher, por causa dos anjos, trazer véu na cabeça, como
sinal de autoridade.”
Os
anjos estavam (e estão) presentes nas reuniões de adoração ao Senhor. As
mulheres de Corinto que compareciam a estas reuniões sem usarem o véu estavam
desonrando a presença dos anjos, pois estavam, aos olhos do mundo, rebelando-se
contra a autoridade devida aos seus respectivos maridos.
Nos
vv. 11-12 Paulo mostra que, apesar dessa sujeição da mulher ao homem, eles
devem entender que ambos estão ligados entre si, pois no evangelho não há mais
a condição feminina humilhante que havia anteriormente.
11:13
– “Julgai entre vós mesmos: é próprio que a mulher ore a Deus sem trazer o
véu?”
Após
explanar a necessidade do véu, Paulo faz uma pergunta retórica para que seus
leitores vissem por si mesmos a necessidade de colocarem o assunto em sua
correta direção. Depois do que Paulo explicou, a única resposta para tal
pergunta seria “não”, ou seja, a mulher comprometida que viesse participar do
culto público em Corinto deveria usar o seu véu.
11:14
– “Ou não vos ensina a própria natureza ser desonroso para o homem usar cabelo
comprido?”
Paulo
lembra seus leitores de que a ordem natural das coisas (PHUSIS, em grego)
demonstra que o uso do cabelo comprido do homem, naquela época e lugar, era
considerado desonroso. Houve outros momentos da história em que homens poderiam
usar cabelo comprido e não eram considerados sem honra, pelo contrário, eram
tidos como mais abençoados e santificados que os demais, por exemplo: Sansão,
João Batista e o próprio Jesus Cristo.
11:15
– “E que, tratando-se da mulher, é para ela uma glória? Pois o cabelo lhe foi
dado em lugar de mantilha.”
A
palavra “mantilha” é a tradução do termo grego PERIBOLAION, que significa
“cobertura”. A natureza, ou seja, o costume social aceito correntemente, era de
que a mulher deveria utilizar o cabelo comprido para se distinguir dos homens.
O cabelo longo seria um sinal de sua feminilidade.
11:16
– “Contudo, se alguém quer ser contencioso, saiba que nós não temos tal
costume, nem as igrejas de Deus.”
Paulo
não deseja que o sentimento de contenda faça parte da Igreja de Deus. Ninguém
deveria utilizar os temas polêmicos para distrair a igreja do seu real objetivo
– pregar o evangelho. Alguns utilizavam as reuniões para semear discórdias e
levar os irmãos a afastarem-se do propósito principal (vv. 17-19).
Portanto,
percebe-se claramente que o uso do véu era sim uma obrigação para as mulheres
de Corinto, defendida exaustivamente pelo apóstolo Paulo.Porém, como explicado
neste estudo, tal obrigação não se aplica a todas as demais igrejas cristãs,
especialmente aqui no Brasil, onde o véu não é considerado um símbolo de
respeito e submissão da esposa para com o seu marido.