O apóstolo João, no fim do primeiro século, escreveu contra as
influências desmoralizantes do Gnosticismo primitivo na Igreja. Enquanto
pretendiam estar na luz, no amor de Cristo, e em perfeição sem pecado, os
Gnósticos cristãos defendiam ódio e licenciosidade na Igreja. João traçou as
falsas reivindicações de tais crentes voltados a uma cristologia herética que
separava Cristo de Sua concreta existência histórica e moral no corpo humano.
Exaltando, portanto, a Cristo como o santo e justo (1João 2:1, 29; 3:3, 5, 7,
8), João retira uma poderosa conclusão: "Todo aquele que é nascido de Deus
não vive na prática de pecado; pois o que permanece nele é a divina semente;
ora, esse não pode viver pecando, porque é nascido de Deus." (1João 3:9).
O apóstolo João evidentemente proclama somente um amor cristão que
consome o pecado na vida dos crentes. Quando os cristãos estão realmente em
Cristo, e Cristo neles, eles andarão "na luz, como Ele está na luz"
(1João 1:7). "Aquele que diz: Eu o conheço e não guarda os seus
mandamentos é mentiroso, e nele não está a verdade. Aquele, entretanto, que
guarda a sua palavra, nele, verdadeiramente, tem sido aperfeiçoado o amor de
Deus. Nisto sabemos que estamos nele: aquele que diz que permanece nele, esse
deve também andar assim como ele andou."
(1João 2:4-6).
Assim, para João, perfeição é mais do que vida sem pecado; perfeição é
uma comunhão moral e um relacionamento de amor dinâmico da alma com Cristo,
revelando o mesmo caráter de santo amor como Cristo. Então, não haverá nenhum
temor em seu coração para o Dia do Julgamento, ou vergonha quando Cristo
aparecer em Sua santa glória: " Nisto é em nós aperfeiçoado o amor, para que,
no Dia do Juízo, mantenhamos confiança; pois, segundo ele é, também nós somos
neste mundo. No amor não existe medo; antes, o perfeito amor lança fora o medo.
Ora, o medo produz tormento; logo, aquele que teme não é aperfeiçoado no amor.
Nós amamos porque ele nos amou primeiro." (1João 4:17-19; ver também
2:28).
João enfatiza a verdade de que o amor cristão não é o fluxo natural do
coração humano, mas o dom redentor de Cristo no cristão, que só pode amar
desinteressadamente porque ele foi amado primeiro em um maior amor por Cristo.
O perfeito amor do cristão é o conceito que João tem de perfeição em ação. Isso
se origina de uma real união de amor da alma com Deus e Cristo. Portanto,
aquele que é nascido de Deus não pode pecar ou odiar. João baseia a
impossibilidade de pecar do crente, não no cristão como tal, mas na presença
mantenedora de Cristo que, no mais alto sentido, é nascido de Deus (1Jjoão
3:9). "Sabemos que todo aquele que é nascido de Deus não vive em pecado;
antes, Aquele que nasceu de Deus o guarda, e o Maligno não lhe toca."
(1João 5:18).
Contanto que a alma esteja unida com Cristo e o Espírito de Cristo
habita nele, esta alma não pode pecar, diz o apóstolo em 1João 3:9. O andar do
cristão regenerado na luz não implica, contudo, em alguma consciência ou
sentimento de santidade. Pelo contrário, o andar na luz significa uma contínua
dependência da graça mantenedora e perdoadora de Deus.
É interessante que João usou o tempo presente quando ele escreveu aos
cristãos batizados: "Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo
para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça." (1João
1:9). Em outras palavras, a vida vitoriosa do cristão não é o resultado
automático de alguma natureza sem pecado nele. Não há justiça inerente no
cristão antes de sua glorificação final no dia de Deus. Portanto, ele pode cair
em pecado de novo, como aparece na consolação de João: "Filhinhos meus,
estas coisas vos escrevo para que não pequeis. Se, todavia, alguém pecar, temos
Advogado junto ao Pai, Jesus Cristo, o Justo." (1João 2:1).
Longe de estar escrita como uma recusa para pecar ou para andar nas
trevas, esta mensagem confortadora revela a consciência de que nos filhos
renascidos de Deus a velha e pecaminosa natureza está operando, sempre lutando
de novo pela supremacia. O conhecimento de inerentes concupiscências da carne e
dos olhos (1João 2:16) conduzirá o crente a um profundo arrependimento do
coração e autocondenação. Somente a confiança implícita na palavra de
absolvição de um Deus que "é maior
do que o nosso coração" (1João 3:20), enquanto andando em amorável
obediência a Ele, poderá tranquilizar o coração diante dEle (1João 3:19).
Quando João distingue entre pecado mortal e pecado não mortal (1João
5:16,17), ele está continuando a doutrina do pecado do velho concerto, que
diferenciava distintamente entre deliberado, presunçoso pecado e pecado
inconsciente, não intencional que mais tarde motivava o arrependimento (Núm.
15:27-31; Sal.19:13,14). O apóstolo deseja esclarecer finalmente, que o cristão
é guardado do pecado mortal ou presunçoso porque ele está sendo livrado desse
caminho de pecado pela habitação do Espírito de Cristo. O filho de Deus não
está mais sob o poder dominante do mal, como o mundo ainda está (1João
5:18-19). Ele está agora vivendo em Cristo (v. 20), participando do amor de
Cristo com seus companheiros crentes em uma comunhão santa e feliz (1João
1:3-4).
Acesso Teológico
Naldo JB
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